segunda-feira, 29 de junho de 2015

#NÃOÀREDUÇÃO

#NÃOÀREDUÇÃO


MENINO-HOMEM
Ana Luiza Flauzina

“Quero me ocupar das tuas inconsequências de menino arrogante

Dessa tua pretensão de ser inabalável

Te salvar da tua estupidez de trocar os estudos, pela pelada do fim da tarde

Quero conter essas urgências, que te fazem roçar seu corpo nessa sua namorada tão sedenta quanto tu

Evitar ladainhas de crianças e títulos de avó que não me convêm

Mas hoje, comprando as velas que sopras amanhã, essas preocupações me soam como privilégio que não tenho

Seu corpo franzino de menino preto começa a ser transformado pelos hormônios e não posso evitar o que está por vir

A identidade registra 16 em poucas horas e me dizem que seu tempo está chegando ao fim...

Eu que já rezo para que as balas não atinjam seu corpo, para que as desavenças não te cruzem os caminhos, para que as fardas não te surpreendam numa emboscada qualquer, agora me ajoelho para que não te enjaulem antes da vida te dar uma chance de amadurecer, de errar, de se redimir

A verdade é que crescer é atividade de risco

A tarefa é: ser salvos de nós mesmos

Mas com seu título de menino revogado

A vida deixa de ser jornada pra se tornar sina

Sina que renova em ti, as angústias do passado

Com sons de navios, de correntes, de chibatas

Sina que renova em mim, as misérias das lembranças

De filhos roubados, separados, mutilados

Sina que impõe a nós, a guerra como a única saída

Por liberdade, por justiça, por amor”

Na contramão dos avanços trazidos pelo Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), o Estado brasileiro dá mais um perigoso passo na direção da redução da maioridade penal. O atual presidente da Câmara dos Deputados, conhecido pela truculência com que conduz os trabalhos da Casa, pela violência simbólica e verbal com que trata movimentos sociais e minorias e pelo silêncio obsequioso e conivente com que se alia ao que há de mais reacionário na política nacional, confirmou hoje (29/06) que a PEC para reduzir a maioridade penal deve ser votada amanhã, 3ªf – 30/06, no plenário da Câmara.

 Medida falaciosa, como tantas outras de caráter penal, a redução insere-se numa corrompida onda de retirada de direitos e descompromisso do Poder Público com a educação. Se a operacionalização prática do sistema de justiça para jovens em conflito com a lei já violava a ideia de internação como exceção, a pretensão agora é de romper de vez com as garantias e a lógica protetiva do sistema de justiça juvenil. O que a onda reacionária do Congresso deseja é rigor implacável nas internações de prima ratio e deslocamento completo de um contingente de jovens para o sistema de adultos, leia-se: para os presídios.

Populista por natureza, descompromissada com políticas integrativas e lança simbólica de um projeto político derrotado nas urnas de 2014, a proposta de redução insiste em vender a integridade de adolescentes em nome de uma suposta pacificação social, em uma pretensa defesa do/a cidadão/ã de bem. Ora, já nos esquecemos da responsabilidade pública com a juventude? Eventos como a Candelária e a brutalidade das FEBEMs, heranças fidedignas da ditadura militar, já não são suficientes na história de perpetuação da tortura e extermínio da juventude no Estado brasileiro?

Nos anos 90, como relata Galeano, telespectadores brasileiros foram convidados a votar: que fim mereceria um jovem autor de um assalto violento? A maioria esmagadora dos votos no extinto programa global “Você Decide” foi pelo extermínio: a pena de morte recebeu o dobro da pena de prisão. Hoje, em meados de 2015, a situação parece não ter se modificado consubstancialmente e a marca da violência com a juventude continua inabalada. Essa violência é marca qualitativa, e não quantificável, dos dados de desigualdade (medidos pela renda e escolaridade). Essa violência atingirá essencialmente a massa excluída da juventude para quem a escola será os Centros de Internação espalhados pelo País. Dos Centros de Internação aos Presidídos; é esse o eixo de política econômica e criminal que defendermos? Substituiremos de fato o combate da pobreza pela sua gestão? No lugar de diminuí-la ou erradicá-la nos contentaremos em geri-la, em administrá-la via sistema penal?

Homicidas, assaltantes, estupradores. É esse o perfil de carreira criminosa que a mídia descomprometida com o saber cientifico anuncia à população em geral. Jovem, negro, envolvido no mercado de substâncias tornadas lícitas. É, por outro lado, esse o perfil do ser humano que encontrará na redução um destino sem volta no crime e na violência.

A pesquisa dos Espaços aos Direitos, em estudo nacional sobre as adolescentes em conflito com a lei, revelou que o ato infracional análogo ao crime de tráfico de drogas representa no Distrito Federal 25% das internações, em Pernambuco pouco mais de 20% e em São Paulo mais de 40%. Dizer não à redução da maioridade penal, então, parece quase um imperativo de racionalidade, já que aquela, se efetivada, será mais um elo na densa cadeia de criminalização das drogas e de sua instrumentalização no trato da pobreza como problema de segurança pública. Policializando problemas que deveriam ser politizados. Criminalizando conflitos que deveriam ser solucionados.

Sim, é sobre a entidade chamada tráfico que estamos falando em essência e não de atos infracionais análogos a crimes violentos.“Existem garotos pobres que têm pai, mãe, nome (...). Pobres com suas obras criminais toscas; suas lambanças. (...) só querendo vender um mato pros garotos ricos. (...) É o único emprego do garoto que tem 14 anos. Como é que o pai vai convencê-lo a ganhar 240 por mês, se ele pode ganhar 400 por semana para soltar rojões?”. E são esses vapores-baratos, serviçais do narcotráfico, descritos por Nilo Batista, que encontram e encontrarão a violência deslegitimada do Sistema Punitivo.

No Estado de Pernambuco, o relatório do Sistema Nacional de Atendimento Socioeducativo ao adolescente em conflito com a lei, realizado no ano de 2012, revela que 90% da população de adolescentes em conflito com a lei, no estado, é usuária de drogas. Esta unidade da federação ocupa o 3º lugar no ranking de mortes de jovens entre 17 - 24 anos (em mil), estando este estado, entre os anos de 2005 a 2007, no 1º lugar de mortes no IHA (Índice de Homicídios na Adolescência). Fica claro, portanto, que reduzir a idade penal é reforçar tais estatísticas brutais. É potencializar a vitimização que já atinge essas pessoas. Paradoxalmente, a redução não trará diminuição da violência, mas trará, sem dúvida, o reforço do sofrimento das vítimas de sempre. Não estamos falando aqui daqueles que são roubados pelo “menor infrator”, mas dos jovens negros e periféricos que morrem diariamente e aos montes, numa perene indigência, numa constante corrente de sangue invizibilizado e brutalizado, na construção negativa de uma subcidadania que mortifica sujeitos e subjetividades.

Dizer NÃO À REDUÇÃO DA MAIORIDADE PENAL, então, é um exercício cívico de cidadania e humanidade, mas é, acima de tudo, um exercício de racionalidade. A sociedade brasileira precisa compreender que o sofrimento da juventude, o sangue do menino preto e periférico, a dor das jovens encarceradas, a guerra armada contra a pobreza, mesmo aquela que se manifesta na mais tenra idade, essas coisas não trarão segurança. As cadeias não nos trazem segurança e a lei penal não reduz a violência. E, mesmo aqueles/as que se mostram mais sensíveis à realidade a sua volta e tentam justificar a “criminalidade” na pobreza, “um tratamento mais ameno para o pobre que não teve nada na vida”, mesmo esses precisam entender, como ensina Maria Lúcia Karam, que a posição precária no mercado de trabalho, os defeitos de socialização familiar, o baixo nível de escolaridade, todos fatores frequentemente presentes entre os/as jovens de classes subalternizadas; esses fatores, ao contrário do que pensa o senso comum teórico, “não constituem causas da criminalidade, mas sim, características com influência determinante na distribuição do status de criminoso”.    


Sendo assim, dialogue com suas/seus amigas/os, familiares, professoras/es. Cobre do/a seu/a deputado/a uma postura pró-direitos humanos. É chegada a hora de alicerçarmos no Brasil um pacto político criminal de emancipação, que contenha a onda reacionária e os arbítrios da violência penal e que aponte para novos horizontes de resolução pacífica dos conflitos. Que convertamos os sofrimentos estéreis do sistema penal em alternativas férteis na construção de uma sociedade popular, democrática e cidadã.
Cristhovão Gonçalves e Diego Lemos

quinta-feira, 11 de junho de 2015

Ultimo encontro de estudos e debates do semestre!

E no último encontro do semestre, o Grupo Asa Branca de Criminologia explora o terreno da Criminologia Clínica com um debate facilitado pelo Prof. Marcelino Lira.

O texto de apoio para a discussão será o

Pereira, Ray. Diversidade funcional: a diferença e o histórico modelo de homem-padrãoHist. cienc. saude-Manguinhos, Set 2009, vol.16, no.3, p.715-728. ISSN 0104-5970


Data: 12/06/2015
Hora: 14h
Local: Auditório da ASTEPI