quinta-feira, 20 de novembro de 2014

No dia da consciência negra, a Faculdade de Direito do Recife imprimiu em simbolismo o que as ruas expressam em corpos negros estendidos no chão.


Os muros da Faculdade talvez não tenham sido suficientes. As salas de aula sem negros/as, a sala dos/as professores/as cheia de brancos/as, os livros de doutrinadores (e aqui o recurso ao “a” fica mais difícil), todos brancos, nada pareceu suficiente.


O racismo que perpetua uma elite branca nos cursos jurídicos, sobretudo nas universidades públicas, revela-se com um simples olhar pelos corredores, pelas fotografias das placas das turmas e continua a se expressar na ausência de negros/as ocupando cargos de promotor, juiz, defensor público e advogado.


Mas é claro que o racismo não vive de simbolismo. O racismo está evidenciado na desproporcional vitimização de jovens negros por homicídios, em nosso presídios abarrotados de corpos negros, nas ruas que maltratam meninos e meninas que perambulam esquecidos e acossados por um medo que cruza a calçada quando os vê, um medo de cor e um medo de classe.


Há quem peça a punição daqueles que quebraram a cabeça de Iansã, desviando o foco da responsabilidade de todos para o “outro”. Nesse caso, serão muitos; serão milhões os que quebraram a cabeça, os que a trouxeram a força em navios negreiros, os que tentaram calá-la, os que a mantêm em nossos presídios, os que a chacinam nas calçadas das cidades.


E ainda, entre as raízes da cultura e a crença do consumismo, o papai noel chegou à casa de Tobias para manter os mecanismos que isolam os estudantes, os professores... A Iansã não pode sair da senzala e chegar no sobrado, quiçá nas escolas que vieram para gerar emprego aos filhos dos senhores de engenho que a cana de açúcar não mais conseguia sustentar. O papai noel traz na sua ingênua sacolinha o desejo da nossa elite de manter cada um no seu lugar como sempre foi.


O Grupo Asa Branca de Criminologia manifesta um profundo repúdio pelo ocorrido. Mas, no dia da consciência negra, a resposta será Palmares e são os tambores que se escutam por toda a cidade e na Faculdade de Direito, que tocam o luto por todas as mulheres e homens vítimas de nossas máquinas de moer gente, o sistema punitivo talvez a mais eficaz delas, sustentado por ideias, ideias que acreditam ser Iansã como papai noel. Ideias que desejam a invisibilidade dos pretos e pobres. Como diria Caetano e Gil, dos que levam

porrada na nuca de malandros pretos
De ladrões mulatos
E outros quase brancos tratados como pretos
Só pra mostrar aos outros quase pretos
(E são quase todos pretos)
E aos quase brancos pobres como pretos
Como é que pretos, pobres e mulatos
E quase brancos quase pretos de tão pobres são tratados